Por Anabela Fino
A crise geral do capitalismo que nos tocou em sorte viver mergulhou a União Europeia numa tragédia grega – expressão usada amiúde para designar um acontecimento doloroso, catastrófico, acompanhado de muitas vítimas – que para mal dos nossos pecados, como soe dizer-se, parece estar ainda longe da catarse, isto é, a purgação das emoções dos espectadores que somos todos. Dito de outra forma, o drama colectivo a que assistimos ainda não se transformou no remédio da alma que há-de levar ao desenlace libertador.
E no entanto a trama adensa-se a cada momento e os sinais multiplicam-se, tantos e tão diversificados que se torna difícil não dar por eles. Da Grécia propriamente dita a Portugal, da Itália à Grã-Bretanha, da Espanha à poderosa Alemanha, sucedem-se todos os dias os pequenos e grandes casos desta tragédia anunciada em vários actos.
A «insolvência» grega já não faz manchetes; a necessidade do debate sobre a renegociação das dívidas e o futuro do euro, avançada pelos comunistas e convenientemente ignorada pelos média dominantes, deixou de ser tabu e entrou na ordem do dia; Balsemão entrou na campanha do PSD como um paladino da liberdade e da democracia, falando do «esquerdismo tardio» de Portas e do «conservadorismo serôdio» de Sócrates, poucos dias depois de ter ameaçado os trabalhadores da SIC com as novas regras de despedimento da troika caso não adiram ao programa de «rescisões amigáveis« apresentado pela administração; Soares diz que «não é tempo de deixar cair» Sócrates, o tal do «Estado social», numa altura em que o País fica a saber – pelos dados oficiais – que em Portugal há 126 mil jovens desempregados, dos quais apenas 10,8 mil recebem subsídio de desemprego (8,6%), e que no mês de Abril a taxa de desemprego já atingia os 12,6%, um ponto acima da média da União Europeia (9,4%) e da Zona Euro (9,9 %).
Da Grã-Bretanha, onde os planos de austeridade draconianos rivalizam com o aumento das grandes fortunas – as mil pessoas mais ricas viram o seu pecúlio crescer 18% em 2010, o que significa que detêm agora soma colossal de 594 mil milhões de euros – chega a notícia de que um em cada quatro alunos residentes em Londres é quase analfabeto funcional quando deixa o ensino primário, que cinco por cento dos adultos ingleses têm um nível de alfabetização equivalente a uma criança de sete anos ou menos de idade, e que uma em cada três crianças residentes em Londres não tem em casa qualquer livro.
Já da Alemanha, onde a senhora Merkel perde eleições na proporção directa do aumento da sua arrogância face aos parceiros europeus, chegou esta semana o caso dos pepinos infectados. Que a culpa era dos espanhóis, apressaram-se a dizer – com aquela convicção de que dos PIGS (Portugal, Itália, Grécia e Espanha, na sigla inglesa) só se pode esperar desgraças – antes de os factos demonstraram que afinal a bactéria assassina Escherichia coli tem provável origem germânica. Não fora o trágico rasto de morte que a bactéria está a provocar e bem se podia pensar que estávamos perante uma nova alegoria encarnada pela «frau» E.coli: o futuro do capitalismo, por mais que se adube, só pode ser o da própria destruição.
Extraído do blog: Cidadã do Mundo
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